terça-feira, 6 de setembro de 2011

O tempo da beleza

A beleza dói. Ela incomoda, irrita, atormenta. Chega a torturar como um parto sofrido para nascer. E não lhe entenda como um ser que por capricho se faz de difícil para aparecer. A beleza não tem consciência. Carrega consigo apenas flores. Flores cujo desabrochar expressa a forma como cada um cultiva a vida.

Para cultivar a vida, as pessoas regam-na com o tempo. Tempo que se investe em ideias e sonhos. Muitas ideias tornam-se sonhos. Alguns então colocam esses sonhos em solo fértil e passam a regá-lo. A seguir, outros pacientemente acompanham seu desenvolvimento e crescimento – sempre os regando –, para, finalmente, alguns poucos persistentes conseguirem vislumbrar brotos, sépalas e pétalas. É um processo que demanda tempo suficiente, assim como qualquer planta depende da água em abundância para ser completa. Comparação recíproca para os gostos da vida. Se não houver tempo suficiente regando os momentos que se quer cultivar, jamais a beleza brotará de nossos sonhos.

A única dificuldade desse processo – não que por ser única a dificuldade deixe de ser difícil – é que tempo exige tempo. E poucos jardineiros conseguem dispor de parte de seu tempo para cultivar suas flores. Maldito o dia que inventaram o relógio! Quantificaram a vida que não pode ser medida e muitos dos que antes cultivavam passaram a acreditar que não cultivavam o suficiente se tivessem que regar tanto suas flores.

A crença na loucura das horas limitou o dia a vinte e quatro horas, trezentos e sessenta e cinco dias ou um ano. Logo, o passar frenético dessas unidades passaram a ditar o quanto de tempo poderíamos gastar com cada sonho plantado. Não se pode mais gastar muito do tempo num sonho apenas, pois as horas me mostraram que ele é limitado e gastá-lo inteiramente num só empreendimento é imprudência, insanidade, além de ser mais fácil diluir os esforços e dores do cultivo com essa tal máquina do tempo. Melhor é mecanizar e agilizar a produção de sonhos para que se possa ter uma reserva de tempo num depósito para a velhice, onde poderá guardar seu porquinho de moedas com reservas de câmbios ultrapassados e inúteis, quando o tempo não poderá ser investido noutra coisa senão em amargurar feitos não realizados. Passou-se a prezar infindáveis ideias feias e incompletas em detrimento de um único, mas belo, sonho desabrochado.

Assim a beleza tem sumido não por ter deixado de ser desejada, mas por não ser mais regada com tempo suficiente. E sem a beleza, de nada vale o tempo de nossas vidas.

N.S.A.

06/09/2011

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